SERTÃO, SER TANTOS
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Nessa semana estou pensando muito na imaginação. As formas e construções da imaginação. A imaginação que educa, a imaginação que faz parte de nossa casa, de nossa decoração. A imaginação que separamos do real e a imaginação que nos torna mais fortes. E de tanto pensar nisso, tô numa "semana do abandono". Semana do abandono é um nome que marido deu pras semanas em que não me importo se a sala tá uma bagunça, em que coloco a bolsa em qualquer lugar e que nem reparo que o boné dele está encima da mesa há dias, coisa que normalmente me deixa histérica.
Fosse do Daime, e diriam que eu estou em miração. Fico andando pela casa, descalça, mobile qual piuma al vento, como quem não está aqui, pois estou mesmo é mais encima, revirando os sótãos de minha memória. Tiro livros da estante, folheio. Redescubro anotações minhas feitas com a saudosa papermate vermelha. Fico uma eternidade olhando o passarinho, ali fora, sem vê-lo, mas vejo os sofreus, marias-pretas e tucanos de minha infância com clareza de passar a mão.
Mas aí, num desses momentos contemplativos, parei na frente da porta do meu quarto.
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Guimarães Rosa (autor da frase emoldurada) de tanto imaginar, imaginou que morreria depois de sua posse na ABL. E morreu mesmo. A imaginação é forte, a imaginação tem poder. Imaginamos amores que realmente vivemos. A imaginação produz, a imaginação transforma. Imaginamos os portugueses chegando em suas caravelas de des-cobrindo o Brasil. A imaginação se aprende, e uma vez aprendida, persiste.
Eu acreditei em Papai Noel até uns 4 anos. Quando deixei de acreditar, ele só deixou mais espaço pras caiporas e boitatás. Que mais tarde se levantaram pra acomodar o diabo na rua, no meio do redemoinho. O meu pai me ensinou a imaginar. A minha avó o ensinou a imaginar. E se nenhum de nós dois somos loucos (pelo menos não patológicos) é porque a imaginação foi sempre lavada com muito amor. E se, estou sentada aqui, imaginando, escrevendo coisas, e massageando minha belíssima edição de Grande Sertão, é porque o amor permite isso. É porque o amor tá lá na cozinha terminando o nosso almoço, sem reclamar do meu não-estar. E porque outros amores estão dormindo na minha cama.
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E você? Inclui na sua casa e na sua vida espaço pra imaginação?
SERTÃO, SER TANTOS
Reviewed by vivianne pontes on
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Nem sempre consigo separar o caráter de "revista" do de diário pessoal. A minha vida não acontece separada dos meus interesses. Nã...
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