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Tutoriais:

TUTORIAL

Charlotte Perriand


Por Silvana Rubino*

Visualizemos a cena. Uma jovem linda, de 24 anos, bate à porta do ateliê do já famoso Le Corbusier e pede para trabalhar com ele. Sua resposta? “Não bordamos almofadas aqui”. Um rompante de misoginia do famoso arquiteto, mas por outro lado a escola da União de Artes Decorativas, freqüentada pela moça, tinha bordado no currículo. E os arquitetos modernos tinha declarado guerra aos ornamentos…

Só que dias depois Le Corbusier e seu primo e parceiro Pierre Jeanneret foram visitar o Salon d’Automne e—surpresa! – a moça fazia móveis em metal, em um momento em que Corbu vinha sendo criticado pela pobreza de seus interiores. Contratada sem vencimentos, Charlotte Perriand (1903-1999) passou a cuidar dos interiores das casas projetadas pela dupla Corbusier-Jeanneret e a pensar nos móveis da casa moderna: a máquina de morar deveria receber equipamentos de habitação.


Alguns móveis que ela fez para seu apartamento, como a cadeira pivotante hoje conhecida como LC7, passaram a ser assinados como Corbusier-Jeanneret-Perriand. Foram dez anos de colaboração e ela foi convidada a deixar o ateliê em 1937, não sem antes desenhar cadeiras e poltronas que hoje são chamadas de LC1, 2, 3, LC4 etc.

Tenho alguma convicção de que os móveis do trio eram antes de tudo criações de Charlotte. Para tanto, basta vermos que antes de sua passagem Corbu e Jeanneret não produziram mobiliário e depois também não. E ela seguiu fazendo seu equipamento interior no Japão, na Indochina e de volta à França depois da Segunda Guerra foi trabalhar de novo, em outro patamar, com Le Corbusier. Os interiores da Casa do Brasil, na Cidade Universitária de Paris, são de Charlotte Perriand. Realizou outros trabalhos com ele e com o maravilhoso designer francês Jean Prouvé. Morou no Rio de Janeiro e era amiga de Lucio Costa. Há suspeita de que desenhou interiores por aqui, encantada por nossas madeiras e pelo pais...

Hoje ela está mais do que em evidência e museus importantes da Europa dedicam mostras ao seu trabalho. Só que quando entramos em uma loja de móveis e perguntamos de quem é a bela chaise-longue conhecida como LC4, a resposta vem pronta em 9 a cada 10 vezes: é do Le Corbusier. E eu, pesquisadora da moça, respondo prontamente: Corbusier, Jeanneret e Perriand! As patentes destes móveis já caíram em domínio público e são muitos os seus fabricantes. Ninguém vai ganhar ou perder dinheiro com isso. Mas não se pode tirar de um artista sua autoria.


Em tempo: a foto que o apaixonado Jeanneret fez dela em 1929 de certo modo sugere a ligação entre objeto e sua criadora. Recostada, a mignon Charlotte toma posse daquela que é talvez sua mais bela criação.

*Silvana Rubino é antropóloga, um pouco historiadora e trabalha com temas ligados à arquitetura, cidades e patrimônio histórico. Já foi conselheira de órgãos de patrimônio e briga com quem for pra defender prédios, casas e outras coisas da destruição. No momento, escreve uma tese-livro sobre Lina Bo Bardi, Charlotte Perriand e Carmen Portinho, três mulheres que contribuíram para crar nossa idéia de espaço moderno. É professora da UNICAMP e organizou o livro Lina por escrito, que saiu pela Cosac e Naify (2009 e 2011).

♥ A série Clássicos do Design é patrocinada pela Essência Móveis, que tem a LC4, inclusive em miniatura.
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